Desde que os
físicos aprenderam a provocar colisões frontais entre as partículas subatômicas
para transformá-las em energia pura, notaram um paradoxo que até então não
havia ocorrido a ninguém. É que a energia produzida desse modo geralmente toma
a forma de novas partículas, metade das quais é feita de matéria comum à outra
metade, de antimatéria. Ou seja, sempre que se cria um próton de carga elétrica
positiva, também surge um antipróton, que é negativo. Se nasce um elétron
negativo, ao seu lado existe um anti-elétron positivo. Antimatéria é
simplesmente isso: um inverso elétrico da matéria usual. Mas, então, por que
não se vê antimatéria no grande laboratório natural que é o universo? Tudo
indica que ela deve ter sido criada em grandes quantidades durante o Big Bang,
a explosão que criou o Cosmo, há 15 bilhões de anos. Mas é praticamente certo
que, dentro do enorme volume gigantesco a nossa volta, não existe o menor traço
de anti-estrelas ou antigaláxias.
A necessidade de
resolver essa contradição explica, em parte, a importância da máquina
experimental montada no laboratório americano Fermilab, desde novembro do ano
passado, para fabricar anti- hidrogênios. São átomos inteiros de antimatéria
nos quais os prótons não têm carga positiva, mas sim negativa. E os elétrons
passam de negativos a positivos. Então, esses elementos de eletricidade
invertida podem fornecer uma pista para a sua aparente ausência no Cosmo: se
forem examinados bem de perto, talvez revelem alguma propriedade nova, que não
havia sido percebida antes.
A oportunidade
surgiu somente agora porque os anti-hidrogênios são conquista recente. Só
passaram a ser produzidos no final de 1995, numa experiência dirigida pelo
físico alemão Walter Oelert, do Cern, sigla em francês para Centro Europeu de
Pesquisas Nucleares. Oelert deu o primeiro passo, mas fez somente nove
anti-elementos.
Este mês, o
Fermilab deu um salto à frente ao demonstrar que é viável fabricar anti-átomos
em quantidade – e, talvez, no fim do processo, fabricar energia. Os cem
exemplares produzidos desde a montagem da “antifábrica”, em novembro de 1996,
não são muita coisa. “Ainda vai ser preciso multiplicar esse número por vinte
ou trinta, para poder fazer um estudo rigoroso”, diz David Christian, um dos responsáveis
pela experiência. Mas, dado o primeiro passo, não vai ser difícil aumentar a
produção e começar a investigar as propriedades dos anti- hidrogênios. Por
enquanto, os físicos não sabem exatamente que tipos de coisa terão que
procurar. Talvez a antimatéria sofra de alguma instabilidade, alguma propensão
interna para desintegra-se. Isso explicaria o seu sumiço durante a história do
Universo. Para Christian, a probabilidade de achar alguma anomalia não é
grande. Mesmo assim, o trabalho não se perderá. Pois, enquanto mantém um olho
no enigma cósmico, os físicos vão explorar um novo tipo de material à
disposição da humanidade. E não é muito improvável que, nos próximos anos, ele
sirva para desenvolver tecnologias inimagináveis atualmente.
Revista Super Interessante,
novembro de 1997.
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